sexta-feira, 13 de maio de 2016

Obrigada, Rubem Alves!

                  

Hoje quero homenagear esse grande professor mineiro, de Boa Esperança,  chamado Rubem Azevedo Alves (1933-2014), teólogo, tradutor, pedagogo e escritor brasileiro. Morreu discretamente, sem os holofotes da mídia,  deixando um legado para os profissionais da educação.  Este espaço é pequeno para sintetizar as suas contribuições, mas, percebi esse débito com esse professor-escritor, por isso essa página. Peço licença aos meus leitores, ávidos pela literatura baiana, mas que tal um mergulho na fonte cristalina de Rubem Alves?
Primeiro texto que trago a tona é “Política e Jardinagem”, numa inspiração soberba, Rubem Alves mostra a distinção e o compromisso de cada elemento desses setores, que se unem quando colocam o amor e o bem da coletividade acima dos desejos pessoais. Ao fazer alusão ao papel do escritor na vida política de uma sociedade, diz: “O escritor tem amor mas não tem poder. Mas o político tem. Um político por vocação é um poeta forte: ele tem o poder de transformar poemas sobre jardins em jardins de verdade.”
Quanta sabedoria!  Rubem Alves diz que a literatura poderá modificar uma cidade, dependendo da vontade política. Ao comparar o político com jardineiro é porque o investimento literário se volta como flores e todos ganham: comércio, turismo, cultura, educação... Alguém se lembra de Ilhéus sem a marca de Jorge Amado?  Geralmente, nem conhecemos a historia de vida do jardineiro, mas as flores plantadas por ele são vistas à distancia.
Outro texto desse grande escritor é “Se é bom ou se é mau...” Ele apresenta uma lição de vida. Fala numa linguagem simples e direta para seguirmos adiante, não engessarmos diante dos obstáculos.  Ele clama para não se lamentar por fatos que aborrecem e modificam a trajetória. Por quê?  Aquele fato que nos pareceu mal, poderá nos causar um bem mais adiante. E ao longo do texto narrativo, diante de acertos e desacertos ocorridos a frase se repete: “Se é bom ou se é mau, só o futuro dirá...
E não poderia ficar de fora desse mergulho a crônica que mostra a tentativa de domesticação que muitas escolas se submetem a fazer com seus alunos,  titulo: “ Os grandes contra os pequenos”. Texto simples, conta a história de uma criança que fica horas tentando decorar o que diz o livro didático, para escapar da avaliação ( te peguei!), enquanto o que ela tem a dizer não é  ouvido nem respeitado.
Ao reler essa crônica de Rubem Alves, lembrei-me de uma situação que presenciei há algum tempo, uma mãe constrangida porque sua filha de 11 anos estava angustiada por conta da avaliação que faria de acordo com um livro literário adotado.  A cada parágrafo lido, diante de algumas cenas de sexo, a menina questionava a mãe: “Minha mãe, o que é mostrar...?” “O que é...?” E mãe, olhava-me, pedindo socorro.
Falando em socorro, nas “escolas gaiolas e escolas asas” que esse grande escritor nos revelou, de certa forma, um convite aos profissionais da educação para olharem, não para as escolas, mas para si mesmos. Porque escola é um conjunto que não pode ser vazio. E a pergunta é: As minhas práticas pedagógicas aprisionam ou libertam  meus alunos?   
Como disse, são inúmeras contribuições de Rubem Alves que sacodem as  nossas frágeis bases. No entanto, uma das lições que unir à minha prática pedagógica é justamente sobre a escuta sensível. Isso porque “toda fala só é bonita quando nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina...”  Dizer o quê?  Depois de Rubem Alves tornei-me uma profissional melhor. Pelo menos me esforço para ser.
E lembro-me de uma ação que cometi há muito tempo, no início da caminhada pedagógica, mas até hoje me envergonho da minha falta de sensibilidade. Havia marcado uma avaliação e avisei que faria a segunda chamada só mediante um atestado médico.  No dia da prova, uma ausência. Um aluno bom da zona rural faltou.  Aquilo me aborreceu, pois teria que elaborar nova prova. Na aula seguinte, ele veio se justificar, antes de ouvi-lo até o final, cobrei o atestado médico. Ele com os olhos marejados, respondeu baixinho e amedrontado como se tivesse diante de um gigante: “Posso trazer a certidão de óbito de minha mãe?” Choramos juntos. E nos tornamos grandes amigos, e eu, mais humana.
 Confesso, essas crônicas funcionam como um “puxão de orelhas” às minhas práticas pedagógicas arrumadinhas e inquestionáveis. O que ensino e o que aprendo com meus alunos?  O que é educação sem essa  re-visão? Sem tecer cada fio para conectarmos uns aos outros num sentido somatório e não excludente.  
De tudo que aprendi com Rubem Alves o mais marcante resumo aqui: avalie seus alunos exatamente como você gostaria de ser avaliado por eles.  Se após essa reflexão continuar satisfeito com o resultado, parabéns!

                                                                                    Elisabeth Amorim/2016

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